Prefeitura de Barreirinha investe na formação de professores indígenas com o projeto Pirayawara

As aulas estão acontecendo no Centro de Treinamento Javarí, no Andirá, e se estenderão até o mês de março de 2016

Prefeitura de Barreirinha investe na formação de professores indígenas com o projeto Pirayawara Fotos: Hudson Lima Notícia do dia 19/02/2016

Sessenta e oito professores indígenas estão desde  o dia 08 de Janeiro participando do último módulo do curso de formação do Projeto Pirayawara, o qual tem como objetivo a formação de professores para atuarem nas regiões indígenas do município de Barreirinha. As aulas estão acontecendo no Centro de Treinamento Javarí, no Andirá, e se estenderão até o mês de março de 2016.

O projeto é executado no município pela Prefeitura de Barreirinha, através da Secretaria Municipal de Educação (SEMED) e pela Gerência de Educação Escolar Indígena da Seduc. A meta principal é garantir aos povos indígenas uma educação diferenciada, específica, intercultural, bilíngüe, de qualidade e que responda aos anseios desses povos. Vale ressaltar que Barreirinha é o primeiro Município do Estado do Amazonas a formar a terceira turma do Projeto, demonstrando o compromisso da Prefeitura  com a educação municipal.

Inserida no projeto há cinco anos, a professora da Seduc Martina Gondim explicou que os professores trabalham com uma carga horária de 140 horas, por meio de oficinas pedagógicas. “Eles levam o que aprendem para trabalhar com seus alunos na sua comunidade indígena, ou seja, lá na sua escola. Trabalhamos muito essa parte com via pesquisa, o que eles produzem e essa produção é sempre voltada para a sua comunidade. É uma troca de experiência muito grande, porque eles quase não precisam muito de material didático, eles trabalham com o material didático dentro da sua comunidade. Eles trabalham matemática com o ouriço da castanha, com as castanhas dentro do ouriço; usam as pedras; toda aquela parte de sementes; construção da canoa; enfim, tudo o que é relacionado com a comunidade indígena. O trabalho é sempre voltado aos locais de trabalhos deles, onde eles atuam como professores”, explanou Martina.

Segundo ela, dentro do projeto das nove etapas os professores já fizeram até o estágio supervisionado. “Nós já fomos in loco onde eles estavam trabalhando e conhecemos do Andirá até a última cabeceira. Foi uma equipe de 15 pessoas formadoras e cada uma foi para a sua área. Eles apresentarão o trabalho final, o qual estamos fazendo a correção. Todos já estão trabalhando e nós estamos apenas corrigindo para serem entregues para digitalização e enviado à SEDUC, a qual é responsável pela confecção dos livros que servirão como material didático para eles trabalharem com os alunos deles”, disse.  

A professora Roselinda Rodrigues enfatizou que o Estado do Amazonas tem 32 municípios com esse projeto, mas somente Barreirinha formará turmas. “Nós observamos que nessas nove etapas os nossos alunos estão aptos a trabalharem em suas aldeias como professores. Eles já estão preparados e daqui para o final da etapa eles já estarão com certeza aptos para receberem sua diplomação do Magistério Indígena. O objetivo do projeto é formar os professores indígenas para que tragam novamente a essência de suas raízes, pois têm muitos povos que já perderam os seus costumes, as suas tradições e suas línguas faladas por seus antepassados”, frisou.

Roselinda disse que o projeto vem para revitalizar e trazer de volta a memória, principalmente dos artesanatos que já estavam esquecidos e a língua materna dos povos. “Esse projeto é importante para eles, uma vez que eles trabalham tanto na língua materna como na língua portuguesa em suas comunidades. A parceria entre o Estado e o município de Barreirinha é enorme, pois trabalhar com as escolas indígenas não é fácil, tem todo um trabalho de logística, de trazer os formadores e os professores de suas comunidades, mas eu vejo que esse ponto é gratificante e percebemos que o município de Barreirinha está de parabéns, porque essa já é a terceira turma de professores que estão se formando. Já temos até professores graduados, especializando-se e Barreirinha está de parabéns com essa iniciativa de trazer o Magistério para dentro das comunidades, formando professores indígenas. Aqui nós temos 75 alunos de todas as aldeias e cada módulo duram dois meses”, afirmou.

Atuando há cinco anos como professor, André Batista de Oliveira, de 49 anos, leciona na aldeia Curuatuba, a penúltima aldeia da área indígena. Ele tem 15 alunos que estudam do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental. “O meu interesse de ingressar nesse curso é por valer muito mais para mim, porque é um curso muito válido. É por meio desse curso que os professores se formam como profissionais, onde aprendemos muito mais como lecionar, como trabalhar com os alunos. Na minha aldeia ainda falam bem a nossa língua, estamos valorizando muito ainda a nossa linguagem. Aprendemos em dois idiomas, a Língua Portuguesa e a Língua Sateré Mawé. Esse projeto vem valorizando a nossa língua e por isso é muito valorizado por nós. Nós como professores damos o conteúdo básico e depois de lá o aluno se desloca para a cidade, onde adquiri mais conhecimentos. Aí ele volta para a área indígena para fortalecer a cultura, para nunca esquecer a sua cultura, isso é muito bom, pois aprende a cultura dos brancos e a indígena, sempre valorizando a própria cultura”, destacou André.

A professora Francilene Batista Oliveira, 28 anos, atua há oito anos na comunidade indígena Guaranatuba. Ela dá aula para 14 alunos, do maternal até o 5º ano. “A nossa dificuldade dentro da sala de aula era dar o multiseriado, mas nesse curso nós aprendemos como repassar cultura para as crianças. As nossas crianças estão praticamente perdendo a cultura, a fala e nós temos o objetivo de resgatar a nossa cultura”, explicou Francilene.

Para ela, o projeto é rico de sabedoria. “Vamos sair daqui felizes e satisfeitos, porque tivemos um estímulo desses professores que o Governo e a Prefeitura de Barreirinha tiveram a preocupação de mandar. Então, nós nunca imaginávamos que teríamos o Magistério Indígena e conseguimos, graças a Deus o Prefeito de Barreirinha nos ajudou muito e ele não deixou que nós desistíssemos como aconteceu em outros municípios. O Prefeito de Barreirinha nos ajudou e apoiou durante todas as etapas. Os indígenas mais velhos nos dizem para nós incentivarmos mais as nossas crianças dentro da sala de aula, porque até mesmo os pais não incentivam mais, eles já querem que a criança aprenda a escrever, a falar o português, a conhecer o dinheiro direito, para quando eles saírem da aldeia não passarem vergonha como acontece com muitos jovens. Os mais antigos têm essa preocupação de dizer que eles estão perdendo tudo praticamente, até mesmo a tecelagem, aí eles pegam muito no pé da gente. Eles dizem que o objetivo do professor é incentivar a todos dentro da aldeia a valorizar a nossa língua e a nossa cultura, porque somos nós que levamos o conhecimento para dentro da aldeia”, contou.

Para Ozinara da Paz Batista, 26 anos, professora na Aldeia Nova Sateré, todos os participantes do projeto estão alegres com o final do curso. “Apesar das dificuldades que passamos hoje estamos na reta final e estamos na expectativa da formação, porque é uma nova fase na nossa vida. Com todo o aprendizado que os nossos professores têm nos repassado aqui nós temos levado um novo conhecimento aos nossos alunos indígenas, isso é gratificante, isso porque aqui aprendemos como devemos dar aula e repassar a nossa cultura para os nossos alunos. Na minha aldeia e em outras aldeias tínhamos a dificuldade de manter a língua e a escrita indígena dentro das comunidades, mas hoje com todo esse conhecimento nós repassamos o que aprendemos para as crianças e para os adultos também, formados pelo EJA (Educação de Jovens e Adultos). O projeto nos ensinou a como valorizar a nossa cultura e a nossa língua, porque em algumas aldeias a nossa cultura não é mais tão valorizada. As danças, as crenças e os costumes, por exemplo, estamos aprendendo a fortalecê-las dentro da aldeia. Com certeza isso vai durar por muitos e muitos anos”, disse ela.

Atuando como professor há 10 anos no Cajual do Alto Andirá, Érico Trindade, 35 anos, falou que esse curso é gratificante, porque levam para as aldeias e para os parentes tudo o que aprenderam no Projeto Pirayawara. “Isso é importante para nós e para as comunidades, pois trabalhamos para desenvolver a melhor educação possível para os nossos parentes, para que quando eles forem estudar na cidade não tenham muitas dificuldades. É muito gratificante estarmos aqui no curso aprendendo, adquirindo novos conhecimentos e assim repassarmos tudo para os nossos alunos, contribuindo com as lideranças tradicionais. Aqui nós aprendemos e deixamos registrado um processo histórico dos nossos antepassados para que as gerações que virão conheçam como acontecia no passado a educação indígena. Quando eu era pequeno eu não tinha o conhecimento dos brancos, mas com o passar dos tempos nós adquirimos conhecimento, antes tínhamos apenas a educação indígena mesmo. Hoje com a educação indígena nós conhecemos a escrita, a leitura, então, aprendemos ao mesmo tempo duas culturas, a nossa e a dos brancos e nós repassamos isso para os nossos alunos, porque a nossa cultura não é diferente da cultura do branco. É importante conscientizarmos os nossos alunos para que eles não percam a identidade indígena, que é sagrada para nós de geração a geração”, explicou.  

Para o professor da Aldeia Bem-te-vi Jonilson Araújo de Paula, 34 anos, com o Projeto Pirayawara hoje os educadores sabem como realmente trabalhar. “Isso foi muito importante para nós, pois saímos daqui professores realmente, uma vez que antes as pessoas contratadas não tinham preparação para trabalhar nas escolas. É por isso que geralmente na aldeia indígena a educação é muito atrasada. Por causa disso existia um número bem grande de analfabetismo nas comunidades indígenas, porque as pessoas não têm preparação e chegam lá e dão aula por dá e as crianças passam por passar. Os professores precisam entender a realidade da comunidade e esse tipo de situação nós não vamos mais aceitar. Através do projeto aprendemos a escrever a nossa gramática que nós não sabíamos, porque falar é uma coisa e escrever é outra mais difícil. Hoje as nossas crianças já sabem falar e escrever a nossa língua, o que não acontecia antigamente. Até os indígenas antigos estão satisfeitos com esses nossos conhecimentos, eles estão aprendendo com a gente. Agora quando eles querem fazer um documento pedindo alguma coisa já pedem a nossa ajuda e eles vão aprendendo também a escrever. Antes da nossa turma já se passaram duas turmas e não foram concluídas no tempo determinado, durou mais de dez anos ou mais. Então, pelo fato do nosso prefeito ser indígena isso nos ajudou bastante com certeza, porque a nossa turma vai se formar no tempo determinado do projeto. Deu tudo certo”, enalteceu.

O Prefeito Mecias Sateré, que participou da abertura do evento, garantiu que vai continuar investindo na educação. Ele ressaltou também que a vinda do Projeto Pirayawara para o município de Barreirinha foi uma luta sua junto com as demais lideranças indígenas e caboclas ainda na época em que era vereador no município e que hoje se sente feliz pela concretização do mesmo.

“É um momento de felicidade ver vocês professores concluindo a última etapa desse curso e digo que foi uma semente que plantamos e que hoje estamos colhendo os devidos frutos”, concluiu o prefeito ao enfatizar que a Prefeitura de Barreirinha vem dando o apoio necessário para que o curso seja realizado de forma satisfatória para todos.

O Projeto Pirayawara foi criado pelo Governo do Amazonas para oferecer capacitação aos professores da educação escolar indígena. A meta principal é assegurar condições de acesso escolar à população indígena e promover o ensino básico, conforme rege a  legislação federal. /// Hudson Lima - ParintinsAmazonas