Roberto Carlos faz declaração sobre liberação das biografias

A Ministra Relatora afirmou peremptoriamente: “Condenar alguém que busca o Judiciário em defesa de sua privacidade é também uma forma de censura.”

Roberto Carlos faz declaração sobre liberação das biografias Rei do Brasil mandou proibir venda de biografia Notícia do dia 15/06/2015

O cantor e compositor Roberto Carlos e o Instituto Amigo declararam-se publicamente por meio de uma nota nesta quinta-feira, 11, sobre a liberação do Supremo Tribunal Federal para a publicação de biografias sem autorização prévia.

“Conforme expressamente defendido da tribuna pelo advogado Kakay Antônio Carlos de Almeida Castro, nossa posição era inequívoca no sentido da desnecessidade da autorização prévia para a publicação de biografias.

Os dois princípios constitucionais consagrados pelos Excelentíssimos Senhores Ministros no julgamento em questão, a liberdade de informação e os direitos ‘à privacidade, imagem, e honra sempre foram objeto de significativa preocupação de parte de Roberto Carlos e todos os que se pronunciaram em seu nome; Esta preocupação aumentou sobremodo quando a ANEL (Associação Nacional de Editoras de Livros) ajuizou a ADI no, 4815 afirmando que pretendia, além de afastar a autorização prévia (tese também defendida por nós), que o STF excluísse a possibilidade de qualquer cidadão biografado – que se sentisse ofendido em sua honra ou com sua privacidade ou intimidade violados – recorresse ao Poder Judiciário; Na petição inicial da ADI 4815, a ANEL afirmou: “41. Um julgamento caso a caso, em relação as informações suscetíveis ou não de serem reportadas, representaria, certamente, a extinção do gênero das biografias não autorizadas, tendo em vista o alto grau de subjetividade do julgamento sobre a relevância de detalhes da vida de qualquer biografado. Mesmo diante do afastamento da necessidade do consentimento do biografado, eventual abertura para julgamentos caso a caso criaria óbice tão significativo quanto a própria autorização prévia.”

Desde o voto da Ministra Relatora Carmen Lucia, ficou claro que o STF, ao mesmo tempo que afastava a necessidade de autorização prévia, ratificava a imperiosidade da inviolabilidade constitucional da privacidade e da honra dos biografados.

Ministros

A Ministra Relatora afirmou peremptoriamente: “Condenar alguém que busca o Judiciário em defesa de sua privacidade é também uma forma de censura.”

O Ministro Dias Toffoli disse que “este dispositivo que estamos a julgar não está dando nenhum tipo de autorização plena ao uso da imagem das pessoas, ao uso da vida privada das pessoas de uma maneira absoluta, por quem quer que seja, havendo ainda possibilidade de intervenção judicial no que pertine aos abusos, às inverdades manifestas, aos prejuízos que ocorram a uma dada pessoa. Isso não é censura, nem afronta à liberdade de expressão.”

O ministro Gilmar Mendes, ao votar, fez questão de esclarecer que acionado o Poder Judiciário, por quem se sinta ofendido em sua dignidade, tem amplitude de ação, podendo, inclusive determinar o recolhimento dos livros, entre outras medidas.

Finalmente, o Presidente Ricardo Lewandowski afirmou que ” não existem direitos ou liberdades absolutos” e reafirmou a “possibilidade das pessoas recorrerem a Justiça”. “É impossível que se censure ou exija autorização prévia de biografias. A Corte hoje reafirma a mais plena liberdade de expressão artística, científica e literária desde que não se ofendam outros direitos constitucionais dos biografados”.

Este equilíbrio entre o direito ‘à informação e o direito à dignidade da pessoa, com a proteção de sua honra, privacidade e intimidade são exatamente os valores que o Instituto Amigo e Roberto Carlos defenderam desde o início de sua luta.”

Artistas celebram

Biógrafo premiado e processado, Fernando Morais considerou a decisão do Supremo Tribunal Federal, de não exigir autorização prévia de biografados ou de seus herdeiros, uma “vitória da luz contra a treva, da civilização contra a barbárie”. “Não é uma vitória dos autores ou dos editores, mas sim da sociedade, que recupera seu direito de saber de sua própria história”, comentou. Morais disse ainda que não se trata apenas de uma vitória das biografias, mas de toda a produção de não ficção.

Lira Neto, autor de trilogia sobre a vida de Getúlio Vargas, também falou sobre isso. “O que pouca gente percebeu é que não apenas o gênero biográfico estava sob inadmissível ameaça. Afinal de contas, o famigerado artigo 20 do Código Civil não restringia, textualmente, a proibição e a censura apenas às biografias não autorizadas. Até então, qualquer narrativa histórica ou jornalística, tese acadêmica publicada em forma de livro e posta à venda em uma livraria, filme, documentário, minissérie ou mesmo qualquer simples notícia de jornal, tudo poderia ser enquadrado no obscurantismo da exigência da autorização prévia”, escreveu em seu perfil do Facebook.

Para Mário Magalhães, biógrafo de Carlos Marighella, a decisão do STF constitui “uma derrota da censura e um triunfo da democracia” e “ameniza os constrangimentos que fazem com que candidatos a biógrafo pensem um milhão de vezes antes de encarar uma biografia”. Ele completa: “A decisão representa um pequeno passo para os biógrafos e um grande salto para a sociedade brasileira. A goleada de votos no STF é o 7 a 1 da censura e do obscurantismo”.

Em nota, Luis Antonio Torelli, presidente da Câmara Brasileira do Livro, escreve: “O STF tomou uma decisão histórica, que contribui para a democracia e fortalece um de seus pilares fundamentais”.

Roberto Feith, vice-presidente da Associação Nacional dos Editores de Livros, responsável pela Ação Direta de Inconstitucionalidade, votada ontem, comemorou o resultado emocionado. “Não imaginávamos, há três anos, que esse julgamento ganharia o tamanho que ganhou. Sou muito grato por ver que o debate chegou à sociedade e que, agora, ganhamos”, disse, em Brasília. Feith acredita que o mercado editorial vai viver um momento de publicação efervescente de biografias.

Ruy Castro, que já escreveu sobre, entre outros, Garrincha, Nelson Rodrigues e Carmen Miranda, também falou sobre o futuro. “Espero que façam logo as biografias do Chico, do Caetano, do Gil, mas biografias para valer, e não os panegíricos que saíram até hoje. Serei o primeiro a comprar.” Há cerca de dois anos, os músicos se posicionaram contra obras não autorizadas.

O biógrafo de Roberto Carlos, Paulo Cesar de Araújo, assistiu da plateia a toda a votação. Ao final, disse ao Estado que estava aliviado. “Agora vou parar para respirar e refletir sobre o que poderia ser uma próxima biografia”, disse. Kakay, advogado do cantor, comentou que se sentia atendido pela votação, mesmo com a liberação irrestrita das biografias.

“Eles disseram que as violações à intimidade serão passíveis de julgamento. Era o que queríamos desde o início.”

(Estadão Conteúdo)