Tempo de boi a gente fica muito sensível né?! Tudo é amor, tudo é saudade. E tome textão.
Ontem a noite assistindo um vídeo do Festival da década de 80 que está no face, a emoção dilacerou meu coração.
Quando comecei a assistir pensei: bem que a mamãe podia estar nesse filme. Impressionante como o amor sabe tudo … pois quase no final do vídeo, lá estava ela, no lugar mais precioso da sua vida: a máquina de costura. Mamãe não gostava de Fotos e são raros os registros que temos. Por isso a importância dessa imagem que eu printei.
Sua paixão na vida foi o Boi Caprichoso. Ela dedicou a vida a essa paixão. Sem medo de errar, era uma das poucas coisas que a fazia feliz.
Sempre que falo dela, lembro seu jeito, piscando muito atrás dos óculos fundo de garrafa e o cigarro do lado. E pois não é que o maldito cigarro está na foto bem no cantinho.
Pois é, ela fumou demais
Sua vida foi assim, ela viveu em meio a máquinas de costura, revistas de fantasias, linhas, pó brilhante, papel laminado e agulhas de bordar.
Dona Ednelza bordava sonhos, costurava felicidade, pregava lantejoulas e pó brilhantes de amor pelo boi azul da estrela.
Era uma mulher tímida, sem muitos estudos, mas muito inteligente e coração bom. “Puxei pra ela” Rsrs.
O amor era tanto que ela transformava nossa casa em QG. Uma casa humilde, na rua Sá Peixoto, coberta de palha, cozinha de chão de terra batido. Mas a simplicidade daquele lugar se transformava com o glamour das fantasias que ganhavam o colorido pelas mãos dela e dos amigos artistas que lotavam a casa todos os dias.
Pó brilhante por toda parte, lantejoulas, penas e tecidos finos davam o tom festivo ao ambiente.
A gente dividia nossas redes, nossas camas, guarda-roupas e nossas mesas com as fantasias do Caprichoso.
Quem conviveu com o boi de pano na sua sala, hoje fica triste com as cercas de jurubeba e os olhares desconfiados.
A gente sente, porém isso já não importa tanto, é a realidade dos novos tempos, dos novos donos. O que importa mesmo é a maravilhosa história vivida, do quanto foi bom sentir a alegria das pessoas que frequentavam nossa casa. Era um sentimento que só o boi consegue unir, único e contagiante. Viviam sorrindo, gargalhando e contando histórias.
Ela amava tanto esse Caprichoso que dormia muito pouco. Ela escolhia dormir nas primeiras horas da noite pra dedicar as madrugadas a bordar e costurar. Se tornou uma bordadeira de mão cheia.
O dia mais triste de sua vida foi quando a direção mandou uma emissária na nossa casa buscar as roupas e anáguas da sinhazinha. Ali ela soube que não iria mais fazer as fantasias. Testemunhei a sua tristeza e as suas lágrimas. Já idosa e doente, ainda achava que podia dar conta. Foi muito duro para ela aceitar que não ia mais costurar o vestido da sinhazinha, já que naquele momento outras tendências estavam surgindo no boi com a entrada de novos estilistas.
O maior legado que ela deixou pra nós foi o amor pelo Caprichoso, amor gratuito sem receber nada em troca. Nunca fez questão de dinheiro ou outra coisa em troca da sua dedicação. Essa sim, bateu no peito de verdade e foi feliz cantando a paixão azul.
E esse amor passou de geração a geração, para os filhos, netos e bisnetos.
Simmmm, ela tem uma bisneta linda hoje bailando para o Caprichoso.
É isso gente… vou falando e esqueço o tempo, adoro contar histórias.
E hoje a história da costureira Ednelza Cid se resume um pouco nessa raridade de imagem.
Quanta Saudade de você Dinezita, Dicanelza, matriarca, minha fanática mamãe. Te amo pra sempre!
Texto: Peta Cid / Jornalista