A outra guerra de Putin: convencer as mães russas a terem mais de 10 filhos

Obcecado por reverter o declínio populacional na Rússia, presidente recria decreto de Stalin e oferece medalha e prêmio financeiro às chamadas “mães heroínas”.

A outra guerra de Putin: convencer as mães russas a terem mais de 10 filhos Putin se encontra com mãe dentro do hospital para mães e crianças em Lapino, na Rússia — Foto: RIA-Novosti, Alexei Nikolsky, Presidential Press Service/via AP Notícia do dia 19/08/2022

O presidente Vladimir Putin acaba de reeditar um decreto da era stalinista, que premia as mães russas que tiverem seu décimo filho, com medalha e ajuda financeira equivalente a US$ 16.500. A meta do programa “Mãe Heroína” é encorajar a população a ter famílias numerosas e, com isso, combater o declínio da taxa de natalidade no país, que certamente terá reflexos com a guerra que ele promove na Ucrânia.

 

No comando da Rússia há 22 anos e com chances de ficar no cargo até 2036, o presidente é obcecado por obter o crescimento demográfico também como uma forma nostálgica de reforçar o poder nos moldes do império russo. O país vem registrando perda populacional em ritmo acelerado desde a década de 1990, quando a União Soviética colapsou.

 

A transição para o modelo capitalista, há 30 anos, veio acompanhada de crise econômica, desemprego e alcoolismo. Além da queda da taxa de natalidade e o crescimento da mortalidade, a imigração caiu e o êxodo de russos para outros países aumentou. A taxa de fertilidade -– 1,58 nascimentos por mulher — é atualmente uma das mais baixas do mundo. E a população envelheceu, com idade média de 40,3 anos.

 

Presidente da Rússia, Vladimir Putin, durante evento em Moscou — Foto: Maxim Shemetov/REUTERS

 

Ao assumir, Putin promoveu uma campanha sistemática para promover a natalidade e evitar a redução populacional, que registrou, entre 1993 e 2008, queda de 148,3 milhões para 143,2 milhões de russos. A partir de 2018, o governo passou a subsidiar parte dos juros das hipotecas para as famílias com mais de dois filhos e ofereceu uma espécie de bolsa anual para quem tivesse o primeiro filho. Em contrapartida, a propaganda antiaborto ganhou força no país.

 

O modelo proposto pelo presidente teve resultados, mas a pandemia do novo coronavírus e, mais recentemente, o recrutamento para a guerra, que Putin chama de operação militar especial, estancaram a motivação dos casais a aumentarem suas famílias. O declínio populacional triplicou nos últimos dois anos.

 

O Kremlin sequer informa o número de vítimas na guerra russa da Ucrânia, que o Pentágono estima em 80 mil feridos e mortos. As projeções demográficas indicam que até 2050, o número de habitantes encolherá e ficará entre 130 milhões e 140 milhões de habitantes.

 

Presidente russo, Vladimir Putin, durante encontro virtual dentro do Kremlin, em 9 de agosto de 2022 — Foto: Sputnik/Mikhail Klimentyev/Kremlin via REUTERS

 

Diante desse prognóstico, Putin reavivou então o programa criado por Stalin em 1944, quando a antiga URSS registrava grande perda populacional causada pela catástrofe da Segunda Guerra.

 

De acordo com o decreto assinado esta semana, a mãe com dez filhos será condecorada com medalha e dinheiro, nos mesmos moldes de reconhecimento de heróis russos por serviços à pátria. A prole precisa estar viva e bem cuidada, embora o governo admita exceções para os mortos em serviço militar ou ataques terroristas.

 

O incentivo financeiro é 150% maior do que o salário médio anual, mas Putin enfrenta outra guerra: persuadir as mães russas a procriarem.

 

 

Por Sandra Cohen, G1 Mundo