Foto: Paulo Sicsú
Notícia do dia 13/01/2021
Se no dia 02 de janeiro a Baixa de São José comemora o aniversário de Lindolfo Marinho da Silva, o Pescador Lindolfo Monteverde, criador ou fundador do Boi Garantido. Dia 12 de janeiro é dia de lembrar da eterna madrinha do Boi do Povão; dona Maria Angela Faria. Viva fosse, dona Maria Angela “Faria" 98 anos. Mas viva sempre está nos corações dos admiradores e torcedores do Vermelho e Branco.
Muitas famílias contribuíram para o Festival de Caprichoso e Garantido. Os “Faria” sem dúvida carregaram, depois de Lindolfo, o Bumbá Garantido. Seu João Pedro Faria empresário JP com dona Maria Angela eram a base dessa família: Zezinho presidente, Paulinho Faria o eterno apresentador "garotinho de ouro", Graça Faria, Antonio Faria e Omir e agora João Paulo Faria (neto de JP e dona Angela) todos "Encarnados e Brancos”. Um dia a história precisa ser não apenas contada, mas registrada, publicada e resignificada dessa grande contribuição deles todos.
Podemos arriscar que esses filhos “Pandegos” como diria o compositor Carlos Paulain, do casal JP e dona Maria, alegraram muito mais Parintins e revolucionaram a “Oitava Maravilha do Mundo”.
Nesse tempo de Pandemia do Coronavírus, de muitas perdas e separações. Me veio essa grata lembrança de momentos eternizados na minha memória e que peço licença de compartilhar com vocês, o primeiro e último encontro com dona Maria Angela, comentar daquela senhor integro e batalhador seu Penteado Rodrigues e daquela Lona Azul, que teve de ser mudada para Vermelho…
Seu Peteado e a Lona Azul
Particularmente esse jornalista conheceu dona Maria Angela no começo da década de 90. Estava na função de “padeiro” e entregador de pão na “Padaria do Penteado”, no Bairro de São Vicente de Paulo.
Seu Penteado Rodrigues era um exímio trabalhador, honesto, bravo e correto. Quem o conhecia de perto, sabia que era de coração mole.
Aquela turma da padaria não era fácil: Carú, Tandera, Banana, Cascalho, Branco, Filho da Nifa, Ronelson, Boca Fede, Dodote (eu) e ainda tinha o Capitão Caverna e depois o Edwan Vascaíno, não era fácil. Sempre tinha mais aparecendo como o Stanley da Marina e outros.
Ednelson Muniz Rodrigues o “Penteado" era casado com dona Raimunda e é irmão do senhor Raimundo Muniz ex-vereador e eterno presidente do time da JAC Clube. Seu Raimundo Muniz junto com Xisto Pereira, Lucinor Barros, Padre Augusto Gianola (todos de saudosa memória) e outro jovens organizaram o Festival de Parintins na década de 60. São os fundadores do festival.
Seu Penteado, seu Raimundo Muniz Rodrigues, filhos, sobrinhos e sobrinhas também contribuíram muito com o Garantido como brincantes, torcedores, sócios e até itens. Lygia Loyola Rodrigues inesquecível torcedora do Garantido. As 'netas' do Raimundo Muniz já foram itens de Caprichoso e Garantido na década passada de 2020.
Seu Penteado tomava café quente na chuva. Dizia que assim não iria sentir qualquer coisa ruim em decorrência do impacto do choque térmico do corpo. Não tinha hora de parar o serviço. Sempre foi perfeccionista.
Foi um dos primeiros a fazer entrega de "pão comum manual artesanal” com quase 1 metro de comprimento, na cidade. Era o sucesso. Tipo pão especial. Para clientes especiais.
Uma dessas clientes era dona Maria Angela Faria.
Seu Penteado fazia uma rota em menos de 2 horas. Para entregas as vezes até 100 pães especiais.
As vezes fazia entrega na bicicleta magrela comum. Mas a entrega dos “pão especial”era somente na bicicleta tipo cargueira.
Naquela cargueira de cor vermelha, suportava até quatro paneiros com pão. Um na bagageira de trás, mais dois na bagageira da frente e outro no guidão da bicicleta.
A lona Azul
No tempo de inverno amazônico de chuva, a água castiga bastante a Ilha de Tupinambarana. Não foi uma ou duas vezes que seu Penteado retornava “irado" da entrega do pão, pois dona Maria Angela mandava ele voltar e não queria aceitar os pães. O motivo: Uma lona azul.
Essa lona azul era bonita e bem novinha. Usava claro para proteger ele e mais a cesta do pão, da chuva e umidade.
Não tinha jeito. Ele podia explicar várias vezes, mas dona Maria Angela, quando ela própria recebia, reclamava.
Numa dessas reclamações seu Penteado me escalou para ir fazer a entrega.
Estava eu, padeiro novo e magricela, elevado e promovido ao posto de distribuidor oficial das entregas especiais.
Antigamente as mercearias, biroscas e box recebiam o pão entre 3h30min e 5horas da madrugada. Isso mesmo.
Seis horas já estava atrasado. Mas isso naquela época. Agora mudou.
Enfim. Eu era de entregar esse horário. Os clientes especiais recebiam entre 5h30min e 7h. Então a promoção minha foi fantástica.
Fui eu fazer a entrega na famosa casa Rosada de Parintins. Onde até a piscina mudava de cor e a água não era azul e sim vermelha.
Ainda bem que não choveu e o pão estava numa sacola branca todo arrumado. Não precisei da lona azul de proteção de chuva.
Dona Maria Angela bem gentil recebeu a entrega.
Mas eu estava com baita frio na barriga de não decepcionar a cliente. Era bem cedinho.
A primeira coisa que dona Maria me perguntou qual era o boi que eu torcia?
Antes de eu responder. Ela emendou; "pois eu não gosto de jeito nenhum daquele boi feio da sociedade”. Ela não pronunciava o nome do Boi Caprichoso. Só contrário.
Então eu revelei ser torcedor do Garantido.
Foi uma risada geral. Festa. Em menos de cinco minutos ela exaltou todos os filhos que atuaram no Garantido. Nominalmente. Até me convidou para conhecer o famoso quintal a qualquer hora.
A Madrinha do Garantido me deu um recado e eu de pronto passei para seu Penteado.
“Dona Maria disse que não quer mais saber daquela lona azul na frente do portão dela”.
Até que seu Penteado teve de arrumar uma lona vermelha. E tudo ficou resolvido. Eu dezenas de vezes fiz a entrega dos pães especiais para aquela senhora referência de nossa cultura.
Um Adeus inesquecível …
Meu último encontro com dona Maria Angela foi dia 12 de janeiro de 2014. Eu jornalista e não mais padeiro.
Estava na função de Coordenador da Assessoria de Imprensa do Garantido.
Fui convidado pelo então presidente Telo Pinto a ir cantar os parabéns a eterna Madrinha.
Dona Maria Angela estava fazendo 91 anos de idade. Ela radiante de felicidade com o Garantido na porta da casa.
Lembro que dona Rosinha Góes estava junto dela. O Israel Paulain, como sempre, um espetacular apresentador, fez as homenagens com alguns batuqueiros. O Garantido rodopiou e bailou para a eterna Madrinha.
Ela não sabia se chorava, cantava ou vibrava.
Lembro que além de nós, estava o grande fotografo Paulo Sicsú e os jornalistas Marcondes Maciel e Márcio Costa e a Heloisa Okamura.
A singela homenagem foi crescendo e quando demos conta, na casa de Dona Maria Angela, não tinha mais espaço.
De café seguiu a brincadeira até a tarde. Paulinho Faria entoou várias toadas. Deu uma chuva pequena naquele dia. Mas quem diz que turma de fé da baixa arregou. A jornalista Bernadete Felippe torcedora do Caprichoso era só alegria. Soraya Cohen contou muitas histórias das loucuras pelo Garantido. Antônio, Graça, Carlos Paulain, todos foram se "ajeitando"no espaço.
Mais emoção ainda quando Dona Maria Angela ganhou de presente o “Boi Garantido”em tamanho original. Foi um dia memorável.
Ironia do destino, numa quinta-feira dia 20 de fevereiro do mesmo ano de 2014 dona Maria Angela partiu.
Maria Angela Faria está eternizada no Garantido. Mais ainda, o jovem compositor Enéas Dias, fez a toada “A benção à madrinha - homenagem à dona Maria Angela Faria”, incluída no DVD FÉ.
A composição é linda e Enéas teve a ajuda de Israel Paulain, do João Paulo Faria hoje amo do Vermelho e Branco e do compositor João Kennedy Souza. VEJA
* Hudson Lima jornalista e editor site ParintinsAmazonas
