Melo é o primeiro governador coadjuvante na cena política do Amazonas em 30 anos

Em 33 anos, o Amazonas teve cinco nomes se revezando no comando do Estado: Gilberto Mestrinho, Amazonino Mendes, Eduardo Braga, Omar Aziz e José Melo. Além de uma “participação especial” de Vivaldo Frota, que se contentou em esquentar a cadeira por alguns

Melo é o primeiro governador coadjuvante na cena política do Amazonas em 30 anos José Melo decidiu não participar formalmente das eleições e disse que só vai se manifestar no segundo turno (Foto: Divulgação) Notícia do dia 12/09/2016

O governador José Melo (Pros) é o primeiro do Amazonas, desde a redemocratização, que figura como coadjuvante nas articulações e definições políticas para as eleições que vão escolher o prefeito do maior colégio eleitoral do Estado, com metade do eleitorado.

Em 33 anos, o Amazonas teve cinco nomes se revezando no comando do Estado: Gilberto Mestrinho, Amazonino Mendes, Eduardo Braga, Omar Aziz e José Melo. Além de uma “participação especial” de Vivaldo Frota, que se contentou em esquentar a cadeira por alguns meses e conquistar uma pensão vitalícia.

Todos os outros exerceram a liturgia do poder que o cargo traz na sua integralidade, ditando os arranjos políticos das eleições em Manaus, o que rendeu a cada um deles força política para prolongar a liderança de seus grupos políticos.

Pela atuação antes e depois das campanhas municipais, os governadores exibiram status de prefeito de Manaus, muitas vezes reduzindo a atenção necessária ao interior do Estado. A concentração tinha razão de ser: a cidade é a maior vitrine política dos caciques por concentrar metade do eleitorado.

Em relação aos governadores que o antecederam, José Melo se diferencia pelo papel secundário nas definições de candidaturas, chegando, no avesso da ordem tradicional da política local, a se tornar alvo preferencial de ataque na reta inicial da campanha e o nome mais rejeitado nos palanques. Foi comparado a um “cadáver” pelo atual prefeito Arthur Virgílio Neto (PSDB).

Em raras entrevistas à imprensa, nos últimos meses, o governador só confirmou sua apatia na liderança política de seu grupo: “Vou atuar como magistrado”, “No campo político eu sou mais como um pato que põe o ovo e não faz barulho”. Foi o que disse em entrevista ao jornal A Crítica há um mês, tentando explicar que não foi excluído das definições políticas do grupo porque “foi ouvido” pelo senador e ex-governador Omar Aziz (PSD).

Lideranças fortalecem seus grupos

Em 1985, na primeira eleição municipal direta após regime militar, o Governo do Amazonas tinha como titular Gilberto Mestrinho e o candidato que venceu a eleição para prefeito de Manaus foi Manoel Ribeiro, que na época era o vice-governador do Estado.

Antes de Manoel Ribeiro, Manaus teve um prefeito indicado por Mestrinho, recém eleito (em 1982), que foi Amazonino Mendes. Com Ribeiro na prefeitura, Amazonino é eleito governador do Amazonas com o apoio de Mestrinho.

Em 1988, antes do fim do mandato de Manoel Ribeiro, a Prefeitura de Manaus sofre intervenção, e o governador de então, Amazonino Mendes, põe na cadeira de prefeito Alfredo Nascimento, hoje deputado federal. Os seis meses de mandato de Alfredo são exercidos sob as digitais do governador Amazonino.

Nas eleições municipais de 1988, a máquina estadual é derrotada por Arthur Virgílio Neto na disputa municipal. O governador Amazonino Mendes, no entanto, não se ausentou da disputa e teve candidato no pleito, que foi Gilberto Mestrinho. Na ocasião, a vitória de Arthur foi apontada como um recado das urnas porque ele se apresentava como mudança ao grupo político liderado por Mestrinho.

Quatro anos depois, em 1992, a potência da participação política de um governador no pleito da capital é novamente exibida por meio da aliança Arthur Virgílio e Gilberto Mestrinho. Arthur que o venceu num discurso de mudança de direção política se alia ao opositor e ambos lançam uma chapa com José Dutra e Wilson Alecrim. A dupla foi derrotada por Amazonino Mendes, que, na ocasião, figurou como “oposição” às máquinas municipal e estadual.

O prefeito eleito não conclui o mandato. Em 1994, deixou no comando da prefeitura o seu vice-prefeito Eduardo Braga, para entrar e vencer a disputa pelo Governo do Estado.

Como governador, Amazonino aponta Alfredo Nascimento como nome de consenso do grupo para a disputa da prefeitura em 1996. Eduardo Braga concluiu o mandato de prefeito, mas não havia reeleição. Alfredo foi eleito, derrotando Serafim Corrêa (PSB) no segundo turno, numa eleição que no primeiro turno teve Gilberto Mestrinho.

Com a aprovação no Congresso Nacional da Emenda da Reeleição, no governo de Fernando Henrique Cardoso, Amazonino se candidata e fica mais quatro anos no Governo. Na Prefeitura de Manaus, Alfredo, seu aliado, também consegue se reeleger à Prefeitura de Manaus, derrotando Eduardo Braga no segundo turno. Mas, antes de terminar o segundo mandato de ambos, Alfredo e Amazonino rompem.

O prefeito acaba renunciando ao cargo para iniciar sua “carreira” de Ministro dos Transportes, em Brasília no Governo do PT. Antes de renunciar, deixa tudo alinhavado para que seu grupo assuma o comando da prefeitura. A escolha era interna da Câmara Municipal.

Em cima da hora, a atuação do então governador Amazonino Mendes é decisiva e tira de Alfredo a possibilidade de ter a máquina municipal naquele pleito. Luís Alberto Carijó assume como prefeito, em 2004.

O governador na época era Eduardo Braga, eleito em 2002 com o apoio de Amazonino Mendes. No pleito municipal de 2004, Amazonino participa da disputa com Bosco Saraiva como vice, por indicação de Braga. Mesmo com as máquinas do governo e da prefeitura, Amazonino é derrotado por Serafim Corrêa.

Braga se reelegeu governador em 2006, e na disputa pela Prefeitura de Manaus em 2008 indicou o seu vice-governador Omar Aziz. Embora não tenha conseguido eleger seu indicado, as sinalizações e registros mostram plena atividade de Braga na definição de conjunturas políticas na época. Tanto que o governador foi um dos principais cooperadores para a não reeleição de Serafim Corrêa. Amazonino venceu o pleito.

As eleições municipais de 2012 exibiram uma briga de foice entre o governador Omar Aziz e o ex-governador Eduardo Braga para indicação do candidato do grupo à Prefeitura de Manaus. Omar Aziz costura a candidatura de Rebecca Garcia (PP) como nome do grupo político. O ex-governador Eduardo Braga não digere bem o papel de coadjuvante e, pressionada, Rebecca renuncia.

Em cima da hora, o grupo coloca a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB) na disputa, mas a comunista é derrotada por Arthur Virgílio Neto.

Na disputa daquele ano, Arthur simbolizava a “oposição” e teve o apoio forte e velado do então prefeito Amazonino Mendes. Vanessa, depois da eleição, chegou a reclamar do papel de Omar Aziz na disputa, que teria apoiado na surdina a candidatura de Arthur.

Papéis

Peça atuante na engrenagem que possibilitou revezamento no poder nos últimos 30 anos, José Melo funcionava como articulador de programas e projetos de governo e de poder para todos os ex-governadores.

Essa atuação projetou grande expectativa para a liderança política que ele podia exercer em Manaus e no interior como governador, mas o desenho desbotou: a apatia causa reclamação e confusão em políticos de Manaus e dos demais municípios.

Nos bastidores, Melo não procura e é cada vez menos procurado. Porém, mantém na estrutura do Estado cargos e funções ligados, por exemplo, à Assembleia de Deus, que tem no deputado federal e candidato a prefeitura Silas Câmara (PRB) uma espécie de representante neste pleito.

Cargos de confiança do primeiro e do segundo escalão do Governo Estadual foram “liberados” para apoiar a candidatura de Marcelo Ramos.

O vice-governador do Estado, Henrique Oliveira, é outro candidato neste pleito, que Melo não segurou e nem turbinou. Em meio às definições políticas e a entrada no jogo de caciques, a participação de Melo era aguardada e até “pedida” por seu vice Henrique Oliveira, que declarou não ter medo da sombra do titular. Mas o governador se recolheu, prometeu “chocar o ovo em silêncio” e subir em palanque só no segundo turno, para não desagradar os amigos.

Melo justifica nesse arranjo seu distanciamento do pleito, diferente de Omar Aziz, que participou de anúncio de candidatura de Silas Câmara e juntou a família e amigos para apoiar Marcelo Ramos. Nas palavras dos próprios aliados, Melo deixa tudo “muito frouxo”.

Aliás, até no racha do grupo ficou claro que o papel principal não é de Melo, porque Arthur travou briga e troca de farpas com Omar Aziz. E foi Omar que veio primeiro a público falar que estava rompido com o tucano.

A crise política e a frequente ameaça da faca que está em seu pescoço, com a ameaça de cassação no TRE e no TSE são consideradas como justificativas para a apática participação de Melo, até este ponto, no pleito  municipal. Outro fator, também comentado nos bastidores político e confirmado por homens fortes no governo, é a ausência de projetos futuros para a sua vida política.

O analista político e dono da empresa Action Pesquisa de Mercado, Afrânio Soares,  afirma que a postura de Melo é realmente diferente do que, em geral, ocorre há três décadas no Estado. Soares aposta que, no segundo turno, o governador possa sair da reclusão e atuar politicamente.

O chefe da casa civil Raul Zaidan afirmou que, em conversas com secretários, o governador determinou isenção neste pleito e que sua missão é terminar com dignidade o mandato. Zaidan afirmou que o governador disse não ter pretensões políticas futuras.

Por Rosiene Carvalho amazonasatual.com.br