Doutor mecânico da bicicleta e Paulo Freire ...

Pessoas querer ser tratadas como doutores somente para termo de status

Doutor mecânico da bicicleta e Paulo Freire ... Charge Paulo Freire Notícia do dia 16/09/2017

Dia desses na minha Parintins, fui até a loja Vídeo Park, na qual trabalha o colega Elcio Farias, fotógrafo excelente. Ali na rua Jonathas Pedrosas, perto da Oficina Tabu, tradicional empreendimento da Ilha. Caminhando encontrei um ouvinte que sempre pede alô quando estou no ar. Ele é um dos mecânicos da loja de consertar bicicleta. Passei na calçada da loja e estava ele sentado ajeitando a roda de uma "magrela":
- Oi seo Koiote!
E eu respondi:
- Bom dia Doutor! Tudo bem?!
E seguir o caminho. Finalizando o que tinha de fazer com o colega Elcio na Loja retornei para ir a outro local. O mecânico estava num "mucho" banco feito de madeira. A tirar um descanso depois de mais um serviço e aguardando o próximo.
Ao me aproximar deu um sorriso gostoso e eu novamente o cumprimentei:
- Ótimo trabalho doutor!
Ele me disse:
- Koiote mano, não sou doutor. Não posso ser chamado assim. Pois nem completei a antiga oitava série do antigo ginásio.
Eu olhei para ele e expliquei que o intitulei de "doutor". Primeiro como uma forma de carinho e respeito, depois pela habilidade dele em fazer o trabalho nas bicicletas. Ele sorrio de novo e me disse:
- Então, tá. Sempre te acompanho no rádio e na TV. Não esquece de mandar um alô pra gente aqui na oficina...
Confesso que fiquei arrepiado com aquele gesto de humildade daquele nobre meu ouvinte e mecânico.
Desde pequeno, quando visitava meus parentes no interior, ouvia a minha avó tratar as pessoas de "doutor". Era "doutor" aqui e "doutor" acolá. Peguei essa "mania" e como forma de tratamento respeitoso trato várias pessoas de "doutor" ou "doutora".
Depois, na escola e na vida profissional fui descobrindo a vaidade de certos "intelectuais" em serem chamados de "doutores". Coitado da pobre dona de casa ou do empregado a não chamar tais seres "superiores" pelo termo.
Advogado não é doutor; delegado não é doutor; juiz não é doutor; assim como árbitro de futebol não é juiz. Prefeito e vice-prefeito não são doutores. Compositor de Boi não é doutor. Jornalista não é doutor. Por isso, jamais deixe pessoas lhe induzirem a você a forma de tratamento não como de carinho, mas de formalidade vaidosa. A não ser claro que tenha doutorado, como o grande doutor da Baixa de São José, Wilson Nogueira ou o doutor da Francesa Camilo Ramos, para citar dois Parintinenses que lutaram e com a educação são "doutores". Aliás, Wilson e Camilo até onde sei mantém o status de jornalista e o outro professor. Vivem muito bem com isso.
Nosso povo além de esquecer a história que tem, assim como esquecer político que comete crime contra a administração pública, se deixa apropriar de nomenclaturas efetivadas pelos "catedráticos" infelizmente.
Assim como meu ouvinte mecânico que na avaliação minha é um "doutor das bicicletas", o grande Brasileiro Paulo Freire, para combater as desigualdades sociais, já ensinava "que ninguém é mais culto do que o outro. Pois o erudito não sabe o que sabe a cozinheira, e o mecânico semi-analfabeto sabe o que não sabe o professor universitário".
De tal forma vivas a esses nossos doutores formados na vida e que lutam com dignidade para viver e sobreviver.

Texto: Hudson Lima é Jornalista.